Eu nunca gostei de açaí

Eduardo Magalhães
4 min readJun 18, 2021

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Alt: Lambe lambe colado ao lado de uma açaiteria dizendo “Eu nunca gostei açaí, mas amava vir aqui te ver”

Hoje vi alguém tentando descobrir quem é tu, lembro que já estive nessa posição, não gostava muito de açaí e era do time dos que diziam que tinha gosto de terra, saia com uns amigos que namoravam que as vezes pegavam o cartão de credito dos pais para ir tomar a tal terra molhada, era todo um trabalho montar a tigela e eu ficava rindo sozinho pensando que o curso de engenharia de alimentos deveria ser algum tipo de arquitetura e ter a ver com montar comidas bonitas como todas as pessoas que vão a açaiterias faziam para tirar fotos bonitas para seus stories no instagram, nessas idas acabava tomando algumas colheres até pegar gosto pela iguaria, quem não gostava e não gosta até hoje é o meu bolso que trabalha num regime de austeridade em relação a estes gastos que são bem expressivos para o meu orçamento que é bem limitado, assim como o kg da carne o do açaí, apesar de ser uma comida doce é bem salgado. Sempre íamos nesse mesmo lugar em questão tinha ar-condicionado, wifi de graça, uma parede pintada com aquelas tintas de quadro negro para as crianças riscar com giz e também a coisa mais linda do mundo atrás do balcão, uma figura misteriosa que eu não sabia o nome mas que estava lá todas as vezes, olhava de relance e nunca ocorria de cruzarmos olhares, aquela moça bonita era intrigante e não tinha nome, uma vez perguntei a uma amiga se ela conhecia, disse que não mas concordou comigo de que ela era linda e ficamos por um tempo animados rindo falando sobre a beleza dela.

Foi assim por um longo tempo, não a conhecia e aparentemente nem conhecia ninguém que a conhecesse até chegar um carnaval e eu nem pulava carnaval, infelizmente fui criado por pais evangélicos, infelizmente pois para mim foi traumático, carnaval era algo do diabo na nossa casa, antes disso quando éramos crianças íamos nos carnavais, nos sujávamos de maisena e espuma na rua e voltávamos para casa bem felizes, até que de repente com deus em nossas vidas perdemos isso, tal hora abandonei a igreja mas continuei sem pular o carnaval pois afinal ainda precisava do teto e da comida que os meus pais colocavam na mesa até que logo após uma outra decepção amorosa que coincidiu com o feriado eu estava cansado de ficar em casa e resolvi sair, foi bem mais fácil do que imaginava, virei pro meu pai e falei “vou na pracinha pular carnaval” ele me olhou triste, afinal seu filho estava indo pecar e se condenar ao inferno, mas sem objeção se ofereceu para me dar carona e lá estava eu na rua como uma criança encantada num parque da disney sem saber direito para onde ir, então ia de um lado pro outro subindo e descendo a rua vendo todas aquelas pessoas felizes, até que no fim da noite estava na praça, acontecia o show de alguma desses cantores que o orçamento de uma cidade metropolitana consegue pagar o cache, até que topei com uns amigos estavam numa muvuca bebendo e dançando todos felizes e tinha lá uma garota vestida de Tokyo e eu olhava para ela e sabia que a conhecia mas não sabia bem de onde, daí sem pretensão nenhuma, pois não tinha mesmo nenhum resquício de autoestima na época para soltar um flerte, perguntei se tu era a moça da açaí e quando me disse que sim finalmente aquele rosto bonito por de trás do balcão tinha ganhado um nome.
Depois disso ainda não lhe conhecia, olhando em retrospecto agora não me sinto confortável nem em falar “depois de tudo”, na verdade foi tão pouco e então depois do tão pouco que aconteceu me sinto patético em deixar-me afetar tanto por alguém que não conhecia e não vivi quase nada. Depois daquele carnaval queria e tentei manter algum contato, a princípio apenas amizade pois logo descobri que era mais velha, já na faculdade, como era linda devia ter tanta gente com os mesmos papinhos que eu, e na verdade eu não tinha nada a oferecer e estava conformado que tudo se resumiria a breves contatos nas redes sociais ou em eventuais idas ao seu trabalho torrar um dinheiro que eu não tinha no açaí que estava a cada ida mais gostoso, até aquele dia que alguns amigos marcaram de beber e fumar e pela boa vontade dos deuses você estava entre os convidados e eu estava muito animado pois na verdade ainda não tinha oportunidade de sair contigo, nem sei o que deu em mim mas quando você disse que não talvez não pudesse ir pois iria trabalhar me ofereci para te buscar, no dia em questão eu não tinha esperança que você fosse, já tinha bebido três latinhas e fumado um baseado mas ai você mandou mensagem e não sei se foi a maconha ou o álcool mas fui correndo te buscar, foi engraçado pois nem te conhecia direito e foi uma surpresa te ver, dessa vez sem o uniforme do trabalho e uau, também percebi que era um pouco mais baixa do que eu me lembrava e lá na porta da tua casa percebi a ideia idiota que era dar carona alguém tão especial no quadro da bicicleta mas ao contrario você achou um máximo, tentou filmar o passeio e eu fiquei tão bobo, tu perdeu a gravação mas tinha te prometido que a gente daria uma outra volta.

Queria continuar, mas não vejo muito sentido nisso, em resumo nos beijamos nessa noite, depois disso nos beijamos mais uma vez e estou sofrendo desde então pelos últimos 6 meses. Enfim, não se apaixonem por pessoas bonitas que trabalham em açaís. Talvez eu continue depois.

Mas é isso, é impossível ir ali e não se apaixonar por ti, não estou torcendo pela concorrência mas espero que essa pessoa de hoje tenha mais sorte que eu.

Boa noite, moça.

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Estudante de cinema não praticante pela universidade federal do Ceará; nordestino; acometido de morar no brasil

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